Há alguns dias, após postar a matéria sobre a antiga fábrica de acordeões Pozza, uma neta dos fundadores da fábrica me fez saber do interesse da família em adquirir um acordeão produzido pela fábrica. Estou tentando ajudar, divulgando o assunto a um grande círculo de amigos e conhecidos, pois posso imaginar os sentimentos envolvidos nisso no contexto da história da família Pozza. Contudo, percebi que esse sentimento pode não dizer respeito somente aos descendentes de quem fabricou, mas também aos de quem adquiriu um acordeão Pozza. Isso que demonstra que um bem produzido pode significar muito mais do que um mero produto exposto numa vitrine. É o caso do acordeão Pozza que descobri em minha cidade na semana passada. Liguei para um conhecido que é professor de acordeão e tem uma loja de venda de instrumentos musicais, inclusive acordeões, tanto novos quanto usados. Perguntei se porventura tinha um Pozza à venda, ao que respondeu negativamente, mas informou que em 2009 teve um aluno que, segundo se recorda, poderia ter um Pozza. Sua lista de ex-alunos revelou um nome: Romualdo Jardini. Um telefonema bastou para confirmar a informação, mas também para revelar que o tal Pozza não está à venda. Pena para a família Pozza (apenas por enquanto, pois havemos de encontrar um Pozza à venda!), mas o proprietário do acordeão, sensível aos anseios da família, gentilmente permitiu que eu fotografasse o instrumento e conhecesse um pouco da sua história.
O instrumento tem grande valor sentimental para Romualdo Jardini. Seus antepassados, assim como os Pozza da antiga fábrica, eram italianos que vieram do Rio Grande do Sul para contribuir com o desenvolvimento do Meio Oeste catarinense. O acordeão foi comprado em 1962 por seu avô, Santo Giardini*, agricultor falecido em 2007, e um dos primeiros moradores da localidade de São José, interior do município de Catanduvas. Era um presente para o seu filho, Vitalino Jardini, pai de Romualdo, que na ocasião completara 18 anos de idade. A vida no interior era muito dura e a música era um elemento que trazia alegria à vida dos agricultores nos finais de semana, nos raros momentos de relaxamento e descontração que estes se permitiam. Quando solteiro, Vitalino tocava acordeão e violão, juntamente com seu irmão Valdir, animando bailes e festas num galpão de chão batido que existiu em São José. Depois de casar e constituir família, em função da dura vida na lavoura e das novas responsabilidades, Vitalino já não podia se dedicar à música como o fazia nos tempos de solteiro e aos poucos foi deixando-a de lado. A certa altura, presenteou o acordeão ao seu filho Romualdo, que também conheceu as dificuldades da vida no interior e se mudou para o Vale do Itajaí em busca de uma oportunidade de crescimento profissional. Entretanto, não esquece suas raízes e procura seguir os passos do pai, inspirados por seu avô, e também aprender a tocar acordeão. Compreende-se, portanto, o sentimento que Romualdo acalenta em relação ao seu Pozza, não querendo se desfazer dele. Trata-se de algo intangível, espiritual, e ao mesmo tempo muito forte e real na vida da parte envolvida. Diz Romualdo: "Essa gaita tem história. Imagina quantas pessoas não tocaram e aprenderam a tocar nela nestes anos todos?" Não temos a resposta a essa pergunta, Romualdo, mas esperamos que você possa seguir honrando a história deste Pozza e que, algum dia, seus descendentes possam ser os próximos a fazer parte dela.
*Giardini é a grafia original do sobrenome da família. Devido a um erro ocorrido no registro do nascimento de Vitalino, pai de Romualdo, que teve o sobrenome registrado como sendo Jardini ao invés de Giardini, este ramo da família passou a se chamar Jardini.